Golpe perdeu força, mas pode reagir; é hora de mobilização

Ativismo político

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Uma das consultorias mais ouvidas e celebradas por analistas de banco e gestoras de investimentos, a Eurasia Group, rebaixou sua previsão de impeachment de Dilma Rousseff. De acordo com relatório divulgado na terça (5), a consultoria internacional estima que se o impeachment fosse votado hoje pela Câmara dos deputados, seria barrado.

A informação foi divulgada por Christopher Garman, diretor da consultoria internacional de risco político Eurasia. Para Garman, faltam entre 20 e 40 votos para os adversários da presidente Dilma aprovar o processo de impeachment na Câmara.

No relatório, a consultoria afirma que, nos últimos dias, o impeachment perdeu força e ganhou espaço a ideia de haver novas eleições — a Rede, de Marina Silva, e periódicos como a Folha de S.Paulo e a Economist passaram a defender abertamente essa opção.

Outra razão para a menor probabilidade de impeachment, segundo a Eurasia, é que a saída do PMDB do governo motivou a negociação desse governo com partidos que podem ajudar Dilma a ter votos suficientes para evitar seu afastamento.

O nível de abstenção será equivalente ao número de parlamentares que o governo conseguir convencer. Abstenção equivale ao voto favorável. Mais importante que acompanhar os indecisos é acompanhar o número de votos que o movimento pró-impeachment tem convicção que terá. Hoje está de 20 a 40 votos aquém do necessário”, explica Garman.

Para o diretor da Eurasia, porém, novos desdobramentos da Lava Jato e protestos nas ruas definirão o desfecho do pedido de impeachment de Dilma.

Ambos podem impactar a expectativa de que o governo pode sobreviver. O cerne do impeachment se resume a isso. Se existir expectativa de que mais cedo ou mais tarde o governo vai cair, as promessas de novos cargos valem muito menos, porque o benefício de se associar ao governo cai”, explica Garman.

Dessa forma, o lado que conseguir fazer sobressair sua tese – de que o governo será interrompido ou não – tende a ganhar mais votos. A articulação política, tal como no mercado, tem trabalhado em cima de expectativas.

Uma importante arma da ala governista, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pode ter seu poder de convencimento reforçado caso tome posse na Casa Civil antes da votação em plenário. “A conversa de bastidor que se fala na imprensa é de que o governo seria feito pelo ex-presidente Lula, com uma repactuação, o que daria condições de sobrevida do governo”, afirma o diretor da Eurasia.

Feitos os cálculos, o que se deve ter em mente é que em menos de uma semana poder-se-á definir a continuidade do governo Dilma Rousseff.

A mobilização à esquerda foi muito forte nos últimos dias. O impeachment começou a semana com menos chances do que na semana anterior devido à forte mobilização de intelectuais, advogados, juristas, artistas, movimentos sociais, militância nas redes sociais. Mas, sobretudo, a difusão internacional do que está acontecendo no Brasil concorreu para reduzir as chances do golpe.

Nesse aspecto, na última quarta-feira (6) a Folha de São Paulo publicou uma bomba. O impeachment de Dilma foi duramente criticado pelo celebrado jornalista norte-americano Glenn Greenwald, quem iniciou a divulgação, através do jornal britânico The Guardian, das informações sobre os programas de vigilância global dos Estados Unidos pela NSA, revelados em junho de 2013 através dos documentos fornecidos por Edward Snowden, um ex-administrador de sistemas da CIA que tornou públicos detalhes de programas que constituem o sistema de vigilância global da NSA americana e que está sendo caçado pelo governo norte-americano por isso.

Greenwald, hoje refugiado no Rio de Janeiro, é cofundador do site especializado em reportagens sobre política nacional e externa The Intercept. É vencedor do Prêmio Pulitzer de Jornalismo em 2014 e do Prêmio Esso de 2013. Sua voz tem forte repercussão internacional.

Nesse contexto, trecho inicial de seu artigo na Folha mencionado acima revela como está sendo visto, fora do Brasil – sobretudo nos países desenvolvidos -, o processo que busca tirar Dilma do Poder sem causas justificáveis.

Os três primeiros parágrafos do texto de Greenwald bastam para explicar por que o impeachment perdeu força nos últimos dias.

O fato mais bizarro sobre a crise política no Brasil é também o mais importante: quase todas as figuras políticas de relevância que defendem o impeachment da presidenta Dilma Rousseff –e aqueles que poderiam assumir o país no caso de um eventual afastamento da mandatária– enfrentam acusações de corrupção bem mais sérias do que as que são dirigidas a ela.

De Michel Temer a Eduardo Cunha, passando pelos tucanos Aécio Neves e Geraldo Alckmin, os adversários mais influentes de Dilma estão envolvidos em chocantes escândalos de corrupção que destruiriam a carreira de qualquer um numa democracia minimamente saudável.

Na verdade, a grande ironia desta crise é que enquanto os maiores partidos políticos do país, inclusive o PT, têm envolvimento em casos de corrupção, a presidenta Dilma é um dos poucos atores políticos com argumentos fortes para estar na Presidência da República e que não está diretamente envolvido em casos de enriquecimento pessoal (…)”

A reação progressista ao impeachment que se espalha pelo mundo já preocupa figuras públicas que têm apreço pela própria biografia. Juristas, artistas, intelectuais, movimentos sociais, pensadores de todas as partes não querem se confundir ou ser acusados de leniência com o que parece, cheira e soa como um golpe praticamente desabrido, de tão fácil de diagnosticar.

Porém, o cálculo político imediatista, a ânsia pelo Poder e uma maioria de políticos que não está nem aí para “essa coisa de biografia” ainda são os fatores determinantes do destino do governo Dilma.

Nesse aspecto, só a continuidade inabalável do combate decidido que a esquerda começou a dar ao golpismo da direita político-jurídico-midiática pode manter o golpe onde está, ou seja, barrado. No dia da votação do golpe na Câmara, os fascistas estarão nas ruas para pressionar os deputados. Se a esquerda não se fizer presente, o golpe será consumado.