Empreiteiras da Lava Jato também pararam de contratar palestras de FHC. E agora?

Reportagem

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Em junho deste ano, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse ao jornal Valor Econômico que não via problemas em receber recursos de empreiteiras investigadas pela Operação Lava-Jato. O tucano não negou ao jornal que o seu instituto tenha sido pago por empresas como a Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa.

A construtora Camargo Corrêa, por exemplo, foi uma das 12 empresas brasileiras e estrangeiras que doaram R$ 7 milhões ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso para a criação do instituto que leva seu nome. Esse dinheiro foi arrecadado pessoalmente por FHC num jantar no Palácio da Alvorada – pago com dinheiro público – em novembro de 2002, quando ele ainda exercia o cargo de presidente da República.

Além de receber dinheiro de bancos, empreiteiras e de outras empresas, o Instituto FHC recebeu, em 2006, R$ 500 mil da Sabesp, uma empresa pública controlada pelo governo do PSDB de São Paulo.

A fundação do tucano também utilizou muito a Lei Rouanet para captar doações a seus projetos, com abatimento no imposto de renda, e conseguiu aprovar um limite de R$ 10 milhões em 2006. Ou seja: o Tesouro brasileiro também banca o Instituto FHC.

Atualmente, o principal “parceiro” do instituto tucano é a Fundação Brava – criada pelo empresário Beto Sicupira, com sede em Delaware, um paraíso fiscal nos EUA. Outro patrocinador frequente das palestras de FHC é o Banco Itaú. A Telefónica de Espanha, que abocanhou o filé da privatização do sistema Telebrás, patrocina o Museu das Telecomunicações do Instituto.

O jantar em que FHC passou o chapéu entre empresários amigos foi descrito em detalhes pela revista Época. Além de Luiz Nascimento, da Camargo Corrêa, participaram Jorge Gerdau (Grupo Gerdau), David Feffer (Suzano), Emílio Odebrecht (Odebrecht) e Pedro Piva (Klabin), entre outros empresário.

Nos dois primeiros anos após sua saída da Presidência, FHC empreendeu uma forte ofensiva para arrecadar recursos para seu instituto, como mostra reportagem da Folha de São Paulo de 2004.

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Esses fatos tornam-se relevantes diante de matéria da Folha de São Paulo, publicada neste sábado (24), que insinua que o fato de empreiteiras envolvidas na operação Lava Jato não estarem mais contratando palestras do ex-presidente Lula denotaria alguma ilegalidade nas contratações que haviam sido feitas anteriormente.

O jornal chegou a montar um infográfico para “provar” sua insinuação.

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Trecho dessa matéria da Folha deixa claro que o jornal acusa Lula pelo fato de as empreiteiras envolvidas Lava Jato não estarem mais contratando palestras dele.

“(…) As empreiteiras envolvidas no escândalo da Petrobras praticamente desapareceram da carteira de clientes de Lula, que recebe por meio de uma microempresa, a LILS Palestras, Eventos e Publicações.

O último evento pago pelas empresas de construção civil –em uma viagem para Angola e Nigéria bancada pela construtora Norberto Odebrecht– ocorreu há mais de um ano, em maio de 2014. Até então, empreiteiros, incluindo Odebrecht, OAS, Queiroz Galvão, UTC Engenharia e Andrade Gutierrez, haviam assumido os custos de 26 palestras e viagens do ex-presidente.

Desde que os primeiros empreiteiros foram presos em decorrência da Lava Jato, em novembro de 2014, até junho passado, Lula não recebeu mais nenhuma palestra nem participou de nenhuma viagem paga por essas empresas (…)”

Juntemos, então, as peças desse quebra-cabeças.

Peça 1 – FHC reconhece que empreiteiras envolvidas na Lava Jato o contrataram para palestras, assim como a Lula.

Peça 2 – As empreiteiras envolvidas na Lava Jato pararam de contratar as palestras de Lula após o início da Operação policial.

Peça 3 – A Folha de São Paulo insinua que interrupção da contratação de palestras de Lula pelas empreiteiras envolvidas na Lava Jato, implicam o ex-presidente.

Agora, recorramos à lógica. Para que a interrupção da contratação de palestras de Lula pelas empreiteiras envolvidas na Lava sinalize o que a Folha quer, essas empreiteiras teriam que ter continuado a contratar as palestras de FHC.

Explico: a tese que a Folha quer empurrar aos seus leitores é a de que as empreiteiras pararam de contratar palestras de Lula por medo. Com as investigações das empresas a todo vapor, elas teriam tido que parar de “subornar” o ex-presidente. Mas como a contratação de palestras de FHC pelas mesmas empreiteiras não teria – na visão da mídia tucana – problemas, então elas deveriam continuar a ser contratadas, certo?

Não é o que acontece. As empreiteiras envolvidas na Lava Jato tampouco continuaram contratando palestras de FHC após o início da investigação e da prisão dos principais executivos dessas empresas. Na verdade, essas empresas estão semiparalisadas, sofrem problemas sérios de caixa, de imagem, enfim, a Lava Jato as está desmontando peça por peça.

A acusação tácita (pero no mucho) da Folha a Lula é mais uma da série de invenções que o jornal vem disparando diuturnamente contra o ex-presidente – o que não ocorreu de forma sequer parecida com FHC nem quando ele, ao fim do seu governo, usou o Palácio do Planalto para extorquir várias das empresas hoje envolvidas na Lava Jato.

Apesar da indignação que essa armação da Folha causa, para Lula ela não chega a ser ruim. Denota que ele ainda inspira terror no coração da direita brasileira, que não se cansa de dizer que ele estaria “morto” apesar de não parar de bombardeá-lo, deixando claro que acha que ele está longe de ter sido anulado politicamente.

Aliás, este blogueiro concorda plenamente com essa tese que a Folha e o resto da mídia tucana acalentam, mas que, obviamente, não confessariam nem sob tortura.