TSE faz “vista grossa” sobre avião fantasma de Eduardo Campos

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A partir de julho último, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) vem fazendo cruzamento de dados entre a prestação de contas da campanha à reeleição da presidente Dilma Rousseff e os gastos do Palácio do Planalto com viagens e eventos no período eleitoral.

O levantamento será avaliado junto com os depoimentos de delatores do esquema de corrupção da Petrobras no pedido de cassação feito pela oposição contra a petista e o vice Michel Temer (PMDB).

A ideia é analisar se houve abuso de poder político e econômico como diz a oposição em representação movida no TSE contra a coligação de Dilma. Além disso, a presença de dinheiro das empreiteiras envolvidas na “lava jato” na campanha estaria sendo vista como indício de irregularidade.

O que acontece é que, logo após o segundo turno das eleições presidências de 2014, o PSDB entrou com uma ação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para apurar se houve abuso do poder econômico e político e “obtenção de recursos de forma ilícita” na campanha de reeleição de Dilma.

No mês passado (julho de 2015), o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou o depoimento de Ricardo Pessoa, dono da UTC, também no processo de interesse dos políticos que Dilma derrotou na eleição de 2014.

Se as denúncias forem vistas como “comprovadas” pelo TSE, tanto Dilma quanto o vice-presidente, Michel Temer (PMDB), podem ter seus mandatos cassados.

Em seu acordo de delação premiada, o empreiteiro-delator disse que doou R$ 7,5 milhões à campanha de Dilma por temer prejuízos em negócios com a Petrobras. O montante foi declarado à Justiça Eleitoral.

O esforço do TSE ao constituir equipe de técnicos só para perscrutar de forma tão detalhada as contas de Dilma, porém, contrasta com o tratamento dispensado a outras campanhas, entre as quais a de Aécio Neves, mas, também, as duas candidaturas do PSB à Presidência em 2014.

A dois dias do aniversário da morte de Eduardo Campos, o episódio vem sendo lembrado pelo seu aspecto humano, com atos de reverência à memória do jovem político, morto em um acidente repleto de indícios de irregularidades eleitorais, entre outras.

Enquanto as contas de campanha de Dilma Rousseff são devassadas com lupa, as dos dois candidatos a presidente que o PSB teve, ano passado, pairam em um mar de irregularidades que desmoraliza a pretensa austeridade que aquela Corte tenta demonstrar em relação à campanha presidencial do PT.

A morte de Eduardo Campos não encerra o dever legal do PSB de explicar à Justiça Eleitoral os milhões que investiu na tentativa de reeleger, primeiro, Campos e, depois, Marina Silva. Porém, como tem sido em tantas outras instâncias judiciais ou mesmo em investigações da Polícia Federal e do Ministério Público, a lei está sendo usada para o PT de forma mais dura do que é usada para outros partidos.

Isso está acontecendo à luz do dia, à vista de todos e sobre o tema contas eleitorais do PSB paira um silêncio ensurdecedor.

Para que se possa mensurar o tamanho do imbróglio, basta lembrar como tudo começou. Em agosto do ano passado, logo após a morte de Campos, a Polícia Federal e a Polícia Civil anunciaram que iriam apurar a suspeita de possível fraude na venda do avião Cessna que caiu em Santos (SP), no dia 13 daquele mês, com o então candidato à Presidência Eduardo Campos, do PSB.

Dali em diante, estabeleceu-se uma zona cinzenta sobre a quem pertencia o avião que matou o candidato “socialista”. Inicialmente, soube-se que pertencia ao grupo A. F. Andrade, dono de usinas de açúcar e que, à época dos fatos, estava em recuperação judicial.

O avião, por conta de a empresa à qual pertence estar sob recuperação judicial, só poderia ser vendido com autorização da Justiça, o que não ocorreu, segundo os policiais.

O grupo A. F. Andrade, de Ribeirão Preto (SP), devia, então, R$ 341 milhões.

Apesar da restrição legal, o avião foi vendido pelo grupo empresarial a alguém chamado João Carlos Lyra Pessoa de Mello Filho e seria registrado em nome da BR Par Participações e da Bandeirantes Pneus, segundo documento do grupo A. F. Andrade enviado à Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) à época do acidente.

Mello Filho, suposto dono do avião, é um usineiro e que multado pelo governo por não comunicar suspeitas de lavagem de dinheiro quando tinha uma financeira. E o dono da Bandeirantes Pneus, Apolo Santana Vieira, é réu em ação penal por importação fraudulenta de pneus.

O comprador assumiu uma dívida de US$ 7 milhões (R$ 15,9 milhões) junto à Cessna, dona da aeronave. Uma das suspeitas é de que as empresas não teriam capacidade para pagar esse valor. Até o dia do acidente, quase três meses após a compra, a Cessna não havia aprovado o cadastro da Bandeirantes.

A compra foi intermediada por Aldo Guedes, presidente da empresa de gás do governo pernambucano e sócio do ex-governador Eduardo Campos em uma fazenda. Foi Guedes quem contratou os pilotos que morreram.

Até hoje, não foi possível saber por que o comprador não passou a aeronave para o seu nome, como manda a lei. Nos registros da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), o Cessna continua em nome do grupo A. F. Andrade até hoje.

Uma das hipóteses é a de que essa manobra foi feito para burlar credores. Segundo essa hipótese, o grupo não fez a transferência para não repassar aos credores o que recebeu. A lei de recuperação judicial determina que todo valor arrecadado seja usado para pagar as dívidas.

Esse era o avião em que viajava o candidato de um partido que após ter sido aliado do PT por mais de uma década, em 2014 passou a acusar os ex-aliados de tudo e mais um pouco, e de um candidato que, entre outras críticas ao PT, acusava o partido de “corrupção”.

Apesar de o TSE não se mexer sobre as contas de campanha de Campos, em março último o procurador geral da República, Rodrigo Janot, determinou a abertura de inquérito para investigar a suposta prática de agiotagem por parte do empresário João Carlos Lyra Pessoa de Mello Filho, que seria o dono do avião.

A PGR suspeitava de que o empresário fosse dono da Câmara & Vasconcelos, uma das empresas responsáveis pela compra da aeronave. O nome da empresa apareceu na Operação Lava Jato da Polícia Federal por ter sido beneficiária de um depósito feito em sua conta pelo doleiro Alberto Youssef no valor de R$ 100 mil.

Assista, abaixo, ao vídeo em que o doleiro faz a denúncia, a partir dos 15 minutos de gravação.

Apesar de Mello Filho ter dito, inicialmente, que era o dono do avião e que o locou à campanha de Campos, ele diz, agora, que “nunca foi proprietário ou explorador da aeronave acidentada”.

Em resposta à ação de três moradores de uma propriedade destruída na queda do avião, a defesa de Mello Filho alegou à Justiça que ele iniciou a compra do avião, mas que a Anac não concluiu os trâmites para a transferência da aeronave.

Os advogados afirmam que, com a não concretização da transferência, os pagamentos foram convertidos em horas de voo. Por isso, dizem, no momento do acidente a operação do voo ainda era de responsabilidade do grupo A. F. Andrade, antigo dono do jato.

Como se vê, estão presentes nas contas de campanha do PSB referentes eleição presidencial do ano passado suspeitas muito mais graves do que haveria contra as contas de campanha da presidente Dilma Rousseff. Inclusive com envolvimento nas investigações da Lava Jato.

No âmbito dessa investigação, em julho a PF fez busca na casa do empresário Aldo Guedes Álvaro e em uma de suas empresas, a Jacarandá Negócios e Participações. Álvaro era sócio de Eduardo Campos em uma fazenda em Brejão, interior de Pernambuco. A Polícia Federal investiga se Álvaro pode ser o verdadeiro dono do avião e se Mello Filho não passou de laranja para que Guedes Álvaro não aparecesse.

A Lava Jato, a PF e o Ministério Público estão investigando a quem, afinal, pertence o avião que matou Campos simplesmente porque esse fato pode deslindar um crime eleitoral. Nesse contexto, seria de se esperar que o mesmo TSE que vem vasculhando tanto as contas de Dilma se posicionasse também sobre a obscuridade das contas de campanha do PSB.

Porém, nada disso está acontecendo. Até porque, até agora o PSB não declarou doação de aeronave que caiu em Santos, matando seu primeiro candidato a presidente em 2014. É isso mesmo: o partido ainda não declarou à Justiça eleitoral as horas de voo feitas pelo avião sem dono.

Apesar de o PSB não ter declarado o avião à Justiça Eleitoral, a defesa do partido sustenta em outra instância, categoricamente, que a doação ocorreu. Isso foi feito na ação de contestação a um processo iniciado por uma família santista que teve imóvel avariado pela queda da aeronave.

O documento foi protocolado em 8 de junho na Justiça comum e diz que a legenda não era dona do jato. Além disso, aponta que, além do avião, a equipe de bordo e pilotos foram cedidos gratuitamente à campanha eleitoral de Campos.

Até aí, tudo bem. Doação eleitoral em forma de cessão de uma aeronave é autorizada pela legislação, desde que essa doação seja declarada. Até hoje, porém, não houve declaração.

Entre agosto e setembro, o TSE irá se posicionar sobre a campanha de Dilma. Ainda não o fez porque trabalha intensamente em busca de alguma irregularidade, com uma equipe inteira de técnicos destacada para perscrutar as contas da petista e fazendo vazamentos sobre suposta rejeição dessas contas, que estaria à vista.

Em um par de meses completar-se-á um ano desde o término da campanha eleitoral de 2014 e enquanto a candidatura Dilma enfrenta uma devassa no TSE, as outras candidaturas a presidente, cheias de irregularidades, são sumariamente ignoradas, o que reforça a tese de que a Justiça está usando dois pesos e duas medidas para julgar políticos.

Aos que me perguntam se haverá golpe, no Brasil, respondo que é por fatos como os que você leu acima que julgo que o golpe já ocorreu. As instituições estão sendo usadas para luta política. Legislativo, Judiciário, Polícia Federal, Ministério Público, Tribunal de Contas da União, todas essas instituições estão sendo usadas com finalidades políticas, com vistas a constranger e quiçá até derrubar o governo que os brasileiros elegeram no ano passado.

O caso escandaloso envolvendo o finado Eduardo Campos e seu partido nem passa perto das preocupações da Justiça Eleitoral mesmo havendo ligações com a Operação Lava Jato.

As mesmas empreiteiras que doaram a Dilma estando envolvidas no escândalo da Petrobrás estão envolvidas nos escândalos da Refinaria Abreu e Lima e do Metrô de São Paulo e doaram recursos a Eduardo Campos e Marina Silva e a Aécio Neves, mas o TSE só investiga a relação dessas empreiteiras com a campanha petista.

Há uma evidência grandiloquente de crime eleitoral do PSB ao usar um avião de origem obscura que ninguém sabe a quem pertence e muito menos de onde vieram os recursos para sua movimentação pelo país durante a campanha eleitoral. E o TSE não diz um A. Não anuncia investigação, nada.

O PSB, por sua vez, nem sofre questionamentos, seja das autoridades, da imprensa ou mesmo dos adversários. A rigidez com que investiga as contas exclusivamente de Dilma Rousseff constitui, por si só, o primeiro de vários golpes que vêm sendo desfechados. O único golpe que falta dar, no Brasil, é o golpe final.