Vazamento de pesquisa para Bolsa é crime eleitoral e financeiro

Ativismo político

 

Na última sexta-feira (19), a presidente Dilma Rousseff convocou jornalistas para uma entrevista coletiva no Palácio do Planalto. Quando um repórter a questionou sobre oscilações da Bolsa por conta de pesquisas de intenção de voto, ela declarou que “Está ficando ridículo. Especulação tem limites. Tem alguém ganhando com isso e não sou eu”.

Nos blogs e redes sociais, já se tornou comum internautas comentarem tendências de pesquisas eleitorais ainda não divulgadas com base na posição da bolsa de valores – quando a bolsa sobe é porque Dilma irá aparecer em queda na pesquisa a ser anunciada; quando a bolsa cai é porque a candidata à reeleição aparecerá em alta na nova pesquisa.

O arcabouço jurídico sobre abuso de poder econômico e sobre crimes contra o sistema financeiro é um tanto quanto omisso sobre esse tipo de manipulação eleitoral e econômica, o que facilita tais abusos. Mas a situação está chegando a um ponto em que vai ficando claro que os institutos de pesquisa só podem estar alimentando a boataria.

Tome-se como exemplo as recentes pesquisas Ibope e Datafolha, divulgadas, respectivamente, nos dias 16 e 19 de setembro. Nas duas oportunidades, o índice Ibovespa dos pregões da Bolsa imediatamente anteriores à divulgação das sondagens comportou-se de acordo com a expectativa a que o mercado foi induzido.

Na véspera da divulgação do Ibope, a bolsa subiu por conta da informação de que Dilma apareceria em queda; na véspera da divulgação do Datafolha, a bolsa caiu por conta de informação em sentido contrário.

Um site chamado “infomoney” tem se especializado em divulgar informações antecipadas sobre pesquisas. Essas informações terminam operando um fenômeno conhecido no sistema financeiro como profecia autorrealizável, ou seja, ao divulgar fato que o mercado financeiro considera bom ou mau essa divulgação influi no comportamento das ações das empresas mesmo que não se confirme

Tem razão a presidente Dilma: isso está ficando ridículo. Mas não só. Além de ridículo, isso está se tornando criminoso porque a queda ou a subida do valor das ações induzem setores da sociedade a encararem a candidatura da presidente da República à reeleição de forma negativa. E também porque investidores compram ou vendem ações com base nessas expectativas.

Esse prejuízo eleitoral para um dos candidatos a presidente advém de um claro abuso de poder econômico de quem produz e deixa vazar o resultado de pesquisas – só tendo um instituto de pesquisa para poder operar esse tipo de golpe.

Já no caso do crime contra o sistema financeiro, difundir boatos como esses – que, muitas vezes, são infundados – permite a certos grupos venderem caro ações baratas e venderem barato ações caras. Tais oscilações bruscas no preço das ações permitem a alguns enriquecerem rapidamente.

Em tese, cumpriria ao Ministério da Justiça, à Justiça Eleitoral ou ao Ministério Público Eleitoral desencadear uma investigação da Polícia Federal sobre esse fenômeno. Porém, tanto os candidatos e partidos afetados quanto qualquer cidadão ou organização podem provocar esses órgãos.

Essa investigação teria que começar pelos institutos de pesquisa. Se não deixassem vazar informações, não poderia haver boataria.

No caso do comportamento do mercado APÓS a divulgação oficial das pesquisas, não se pode fazer nada. Os investidores têm direito de gostarem ou não deste ou daquele candidato. Porém, o peso que a mídia vem dando ao comportamento desses investidores diante da realidade eleitoral constitui abuso de poder econômico na eleição.

Assim como televisão e rádio não podem emitir opiniões sobre os candidatos por serem concessões públicas, tampouco deveriam poder difundir opiniões sobre por que o mercado de ações reagiu desta ou daquela forma diante de uma pesquisa já divulgada ou a ser divulgada.

O ideal seria que as autoridades eleitorais se manifestassem sobre o assunto. Na falta dessa atitude, caberia à coligação de Dilma interpor uma representação ao Ministério Público Eleitoral. Porém, se nenhum desses atores agir, qualquer cidadão pode fazê-lo.

Se ninguém mais agir, este Blog, do qual surgiu a ONG Movimento dos Sem Mídia, poderá pedir, através da Organização, a abertura de investigação que, precipuamente, deveria ser conduzida pela Polícia Federal. E, como sabem os leitores mais antigos, esta página nunca se furtou a pôr o guizo no gato, se necessário.