A onda Haddad

Análise

Há pouco mais de uma semana, um colunista, achando que faria graça com a candidatura de Fernando Haddad, asseverou que, para o petista vencer a eleição, teria que se converter em um legítimo fenômeno político-eleitoral em razão do tempo que resta para a eleição.

Pois bem: pesquisas Datafolha e Vox Populi divulgadas ontem (29.08) dão conta de que José Serra, em algo como um mês, perdeu cerca de um terço de suas intenções de voto, enquanto que Haddad, no período, quase triplicou as suas.

Na verdade, até entre o PT está havendo certa surpresa com o desempenho de Haddad por conta de uma questão que se pensava que influiria negativamente no processo eleitoral sobretudo da capital paulista, dado seu histórico de antipetismo: o julgamento do mensalão.

Ora, se o PT vem enfrentando dificuldade há anos em São Paulo, se o PSDB estabeleceu um feudo no Estado e se cristalizou na capital desde 2004, certamente que o eleitorado daqui deveria se embriagar com as overdoses de mensalão que a mídia está injetando na veia do público todo dia, o tempo todo.

Surpreendentemente, não é o que está se vendo. Assim como vem ocorrendo no resto do Brasil a mídia pode até mandar no STF, mas continua não mandando no povo, que parece estar sabendo separar o julgamento do mensalão das eleições.

Seja como for, aquele colunista tinha certa razão: se Haddad continuar crescendo no ritmo em que está crescendo e vencer a eleição, tornar-se-á um dos maiores fenômenos políticos da história recente.

Tentarão negar que sua candidatura está se tornando uma onda e dirão que o fenômeno da eleição é Celso Russomano. Nada mais falso. Ex-candidato a governador, amplamente conhecido por atuar há muito na tevê, não há nada de excepcional em seu desempenho.

Russomano vem surfando no desconhecimento de Haddad e na onda negativa que  engolfa a candidatura Serra devido ao clima de constrangimento que está se formando entre os seus eleitores, pois falar mal de Kassab – e, portanto, de Serra – está virando moda em Sampa.

Em resumo: Russomano beliscou parte do eleitorado de Serra e poderá ficar com ele, mas a parte do eleitorado que pode votar em Haddad – e que está consigo – tem tudo para voltar às origens dada a superioridade política e de recursos do petista, que tem partido e tempo de televisão.

O fator Lula tem limitação para beneficiar Haddad. O ex-presidente não é tão popular assim em São Paulo, mas certamente tem um eleitorado muito consistente na cidade que inclusive já acedeu a um pedido seu para que votasse em uma desconhecida.

O eleitorado tradicional do PT e que pode atender ao pedido de Lula certamente é bem maior do que os 14% aos quais Haddad chegou nas pesquisas supramencionadas. Não existe lógica alguma para que essa transferência de votos não se acentue. Até porque, está aumentando.

Claro que o fator que mais está ajudando Haddad é que o horário eleitoral, em vez de ajudar Serra, prejudicou o tucano. A propaganda, como se disse aqui, reavivou a memória do eleitorado, fazendo com que se lembrasse de que quem lhe deu Kassab foi Serra.

Quando se escrevia neste blog, meses e até anos atrás, que a vida em São Paulo estava piorando, muitos podem ter pensado que aqui se estava fazendo política. Não era. Já escrevi isso um milhão de vezes e volto a dizer: viver nesta cidade está uma tortura.

A piora da qualidade de vida em São Paulo se acentuou sobremaneira nos últimos anos. As tensões sociais e a ausência de políticas públicas voltadas justamente para mitigá-las estão cobrando o preço dos atuais gestores da metrópole.

O suicídio eleitoral de Serra também teve contribuição do seu alienado programa eleitoral. A cidade que a campanha tucana mostra, nem as câmeras acreditam nela – que dirá o eleitorado. Pelo contrário: aquela cidade fictícia irrita.

O núcleo duro do eleitorado de Serra, hoje, concentra-se nas classes alta e média alta que não vivem a rotina da cidade e que têm poder de influência sobre setores inferiores da pirâmide social. Como essa elite não vive São Paulo, dá-se ao luxo de não se preocupar com ela.

Seja como for, a figura de Haddad, os recursos de sua campanha (tempo de tevê, grande marqueteiro etc.) e o esgotamento da paciência dos paulistanos com a eterna vitimização e exaltação de Serra pela mídia estão formando uma onda política, a onda Haddad.