Oposição ainda tem muito fôlego

Análise

A desintegração dos partidos de oposição começou a se desenhar logo após a vitória de Dilma Rousseff, em 31 de outubro de 2010, e, de lá para cá, acentuou-se severamente apesar de o adversário dela no segundo turno da eleição presidencial, José Serra, ter obtido um percentual significativo de votos.

Este texto procura entender e explicar por que, apesar de uma votação que não deixa de ser expressiva, a oposição mergulhou nesse processo autofágico. Os cerca de 44 milhões de eleitores que se opuseram à continuidade do governo Lula continuam com o mesmo espírito oposicionista em relação a Dilma?

É possível que as dezenas de milhões de eleitores que votaram em Serra não constituam mais o mesmo “mercado” potencial da oposição no Brasil? Há dados que sustentem essa possibilidade? Se não, por que a oposição se desestrutura da maneira que está se vendo?

A tese da desestruturação oposicionista tem uma base sólida: a fuga de quadros do PSDB, do DEM e do PPS (os partidos de sustentação da candidatura Serra) para partidos da base governista e para o partido que vem sendo considerado como cria do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab.

Em primeiro lugar, apesar de o eleitorado anti-Lula e anti-Dilma em 2010 ter sido expressivo, as pessoas que adotaram essa postura eleitoral foram empurradas pela mídia para a oposição à continuidade que representaria a eleição de Dilma.  Por outro lado, quem é convencido uma vez pode ser convencido outras.

É um erro, portanto, julgar que a desestruturação do PSDB, do DEM e do PPS signifique que não há mais espaço para a oposição. Aliás, ao contrário do que muitos pensam, o partido de Kassab parece mais tentativa de reorganizar a oposição do que de aderir ao governo. Até porque, ao menos hoje persiste um imenso eleitorado conservador.

O grande drama da oposição é que a sangria de parlamentares e até de chefes do Poder Executivo rumo ao governismo que sofreu e que ainda irá sofrer a debilitará e impedirá de impor óbices ao governo. Dilma governará com mais tranqüilidade, o que, se for bem aproveitado, pode retirar da oposição boa parte do eleitorado que mobilizou ano passado.

Apesar do aumento da chance do PT de fazer um governo ainda mais popular do que fez entre 2003 e 2010, isso ainda não aconteceu e dependerá de como o país reagirá aos problemas que tem, tais como inflação, violência, criminalidade, má qualidade da saúde pública e da educação pública.

O impacto de inclusão social da era Lula tende a diminuir muito nos próximos anos. O que resta para incluir na nova classe média não representa mais um contingente tão expressivo quanto o que ascendeu de classe no governo anterior e que deu a Lula a aura de milagreiro, por assim dizer, por ter tirado o país do atoleiro econômico em que se encontrava quando ele assumiu.

As regiões e os setores da sociedade que constituem o núcleo duro do conservadorismo descontente com a inclusão social maciça da primeira década do século XXI têm primazia de uso da grande imprensa para tentarem reescrever a história e conceder aos políticos que hoje encarnam a direita possível o mérito pelo  soerguimento nacional

Tudo reside na capacidade da memória popular de reter o que era o Brasil até 2002. Tudo reside, portanto, na comunicação. O movimento na internet surgido durante o governo Lula, que enfrentou a grande mídia e conseguiu plantar o descrédito da maioria nela, também tende a crescer com a inclusão digital que vem por aí.

Os pesos de cada um desses fatores no espírito do eleitorado que elegerá o sucessor ou a sucessora de Dilma Rousseff, ainda se farão conhecer. Todavia, engana-se quem menospreza o fato de que a oposição tem ainda muito campo para atuar e recursos quase ilimitados em termos de comunicação e financiamento.

Parece que vai perdendo força a estratégia de criminalização do grupo político capitaneado pelo PT. Ao menos no caso de a economia continuar indo bem. Grupos políticos como o que se agrega em torno do partido supostamente encabeçado por Gilberto Kassab podem estar planejando estratégia menos tosca.

A eventual fusão do PSDB com o DEM e com o PPS pode significar a persistência na tática de aliança com a mídia tradicional para explorar escândalos, e o PSD, de Kassab, pode ser uma estratégia nova de oposicionismo – menos truculento, mas deixando outro grupo atuando na tática de destruição moral do governo Dilma.

Se essa estratégia será viável, só o tempo dirá. Por mais que parta de uma situação bem adversa, ao menos revela uma inovação na política brasileira.

Mas que inovação é essa? O PSD é mesmo uma tentativa de inovar no oposicionismo ou não passa de um ajuntamento de adesistas que foge de uma possível derrocada ainda maior da oposição que um governo cheio de instrumentos como o de Dilma ameaça gerar?

O que se sabe de concreto, até agora, é que quase metade do eleitorado pôde ser convencido pela mídia a votar contra um governo que promoveu uma verdadeira revolução social e econômica no Brasil. Conduzir tanta gente como gado, não é pouco. A oposição ainda tem muito fôlego.